Quem acompanha as novidades do mercado cervejeiro e curte provar os lançamentos das microcervejarias brasileiras certamente já se deparou com uma New England IPA, também conhecida por outros nomes como Juicy IPA.

Se você quer saber um pouco mais sobre esta tendência, chegou ao lugar certo. Confira aqui o que é essa tal de New England IPA, de onde veio e para onde ela (possivelmente) vai.

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Nem todas as IPAs nasceram iguais. O estilo India Pale Ale talvez seja um dos que apresenta mais variações, da White IPA à Black IPA, passando por tudo que é possível no meio do caminho.

Quase todas as microcervejarias produzem pelo menos uma (às vezes, várias) India Pale Ales, e boa parte dos consumidores de cervejas artesanais poderiam ser chamados de “lupulomaníacos”. Talvez por isso, junto com a criatividade dos cervejeiros artesanais, as IPAs tenham tomado formas tão diferentes desde sua popularização a partir dos anos 1970 nos EUA.

Então já sabemos que uma India Pale Ale meio diferentona não é algo fora do comum. Mas onde a New England IPA entra nessa história?

Como surgiu a New England IPA

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A Nova Inglaterra (New England, em inglês) é uma região de grande importância histórica localizada no nordeste dos Estados Unidos, englobando os estados Connecticut, Maine, Massachusetts, New Hampshire, Rhode Island e Vermont. Daí já surgem outros dois nomes utilizados para o estilo: Northeast IPA e Vermont IPA.

E é justamente em Vermont que fica localizada a cervejaria The Alchemist, uma das mais cultuadas dos EUA. Fundada em 2003, os caras se especializaram em “IPAs frescas e não filtradas”, e sua cerveja mais famosa é a Heady Topper, uma Double IPA avaliada com nota máxima no RateBeer e BeerAdvocate e bastante disputada entre os beer geeks. A demanda é tão grande que a cervejaria limita compras a quatro Four Packs, ou 16 unidades, por pessoa.

De acordo com o proprietário e cervejeiro da The Alchemist, John Kimmich, eles não fazem “nada de tão diferente de outras cervejarias” com a Heady Topper. Suas características vêm de uma preferência pessoal do cervejeiro por um perfil mais limpo de amargor, com aromas e gostos de lúpulo em evidência, decorrentes da adição tardia de lúpulos na fervura. Ele nem acha que criou um novo estilo – a Heady Topper é só uma versão de Double IPA como ele gosta de beber.

Inovadora ou não, o fato é que esta cerveja influenciou várias outras cervejarias da região a produzirem algo similar, desencadeando a tendência das New England IPAs que vemos hoje.

Características sensoriais das New England IPA

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Os guias de estilo ainda não catalogaram suas características sensoriais, e pra complicar ainda existem variações de New England – New England Double IPA, New England Session IPA, e por aí vai. Mas de modo geral elas apresentam as seguintes características:

Visual: Cor amarelada, totalmente turva e com baixa formação de espuma.
Aroma: Aromas intensos remetendo a frutas tropicais como goiaba, mamão, manga, melão e lichia.
Paladar: Médio-baixo amargor e dulçor, corpo cheio, baixa carbonatação, gostos de lúpulo muito presentes e que sobram no final.

Algumas técnicas de produção, em geral pouco comuns na produção de IPAs convencionais, são empregadas para alcançar este perfil. São elas:

  • Adição de cereais não maltados e/ou com alto teor de proteínas como trigo, aveia e centeio. Isso dá à cerveja seu corpo cheio e textura cremosa, além de contribuir para a turbidez.
  • Uso de variedades de lúpulo com perfil tropical, tipicamente variedades australianas, neozelandesas e norteamericanas.
  • Fervura curta (ou até mesmo inexistente!) dos lúpulos, que são adicionados em grande quantidade e muitas vezes em múltiplas adições de dry-hopping, para alcançar o máximo aroma com menos amargor. Este é um fator importante no preço final do produto, pois o lúpulo é uma matéria-prima cara no Brasil.
  • Fermentação com leveduras de baixa atenuação (que consomem menos açúcares), baixa floculação (se mantém em suspensão na cerveja) e que produzem compostos aromáticos frutados. A levedura mais característica das New England IPA é a Conan, utilizada pela The Alchemist na Heady Topper.
  • As New England IPA não são filtradas, resultando em sua aparência turva.

Talvez a característica mais impactante das New England IPA seja o seu visual. Tirando alguns estilos específicos de cerveja como as Hefeweizen ou Witbier, normalmente a turbidez é algo a ser evitado e os cervejeiros trabalham duro para produzir cervejas cristalinas e estáveis.

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Mas com as New England IPA é diferente. A turbidez não só é aceitável, como é desejada! Essa combinação de aparência opaca e baixa carbonatação deu até origem a uma outra “tendência”, desta vez de serviço: o chamado Gringo Pour, algo como “serviço gringo” em inglês.

O Gringo Pour envolve servir a cerveja até estar alinhada milimetricamente à borda do copo, quase transbordando e com pouco ou nenhuma espuma. É feito tipicamente em um copo ovalado, parecido com um taça snifter sem a haste.

Assim como a própria cerveja, o Gringo Pour divide opiniões. O que você acha?

Novo estilo ou moda passageira?

Como em toda boa discussão, há bons argumentos dos dois lados.

Por um lado, há o simples fato de que a New England IPA é um desenvolvimento muito recente e portanto ainda não consta nos principais guias de estilo, BA e BJCP. Afinal, quase todos os estilos de cerveja são resultado de vários séculos de desenvolvimento de técnicas, ingredientes, preferências culturais e limitações tecnológicas. Além disso, as New England IPA não apresentam o amargor intenso de lúpulo, característica associada a todas as variações de India Pale Ale.

Por outro lado, uma das características que une as diferentes India Pale Ale no mesmo balaio é o seu perfil intensamente lupulado. Embora sejam mais tímidas em amargor, as New England IPA ainda apresentam os lúpulos em primeiro plano, com força total. E a criatividade é uma característica fundamental da produção de cervejas artesanais – todos os estilos estão em constante mutação, adaptação, evolução. Hoje há uma liberdade sem precedentes para combinar técnicas e sabores inéditos, e há séculos atrás seria simplesmente impossível produzir uma cerveja de origem inglesa, com lúpulos australianos, nos EUA.

E que época maravilhosa para se viver!

Algumas New England IPA brasileiras para provar

No final das contas, não importa tanto se é de fato um novo tipo de cerveja que entrará nos guias de estilo. Também não importa se não passa de uma adaptação passageira de um estilo consagrado.

Para nós, o que importa mesmo é a qualidade do que está no copo. E muitas New England IPA que estão surgindo no mercado brasileiro merecem destaque por serem excelentes cervejas, independentemente da categoria em que se encaixam. Enquanto ninguém se decide, vamos chamando de New England IPA mesmo e está tudo certo.

Confira aqui algumas New England IPA brasileiras que vale a pena provar!


E você, já experimentou alguma New England IPA? O que achou da experiência?

Conte pra gente nos comentários!